segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Poemas para recordar

A Senhora de Brabante

Tem um leque de plumas gloriosas,
na sua mão macia e cintilante,
de anéis de pedras finas preciosas
a Senhora Duquesa de Brabante.

Numa cadeira d'espaldar dourado,
escuta os galanteios dos barões.
- É noite: e, sob o azul morno e calado,
concebem os jasmins e os corações.

Recorda o senhor Bispo acções passadas.
Falam damas de jóias e cetins.
Tratam barões de festas e caçadas
à moda goda: - aos toques dos clarins.

Mas a Duquesa é triste.
- Oculta mágoa vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
– Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

Dizem as lendas que Satã
vestido de uma armadura feita de um brilhante,
ousou falar do seu amor florido
à Senhora Duquesa de Brabante.

Dizem que o ouviram ao luar nas águas,
mais louro do que o sol,
marmóreo e lindo, tirar de uma viola estranhas mágoas,
pelas noites que os cravos vêem abrindo...

Dizem mais que na seda das varetas
do seu ducal de mil matizes...
Satã cantara as suas tranças pretas,
– e os seus olhos mais fundos que as raízes!

Mas a Duquesa é triste.
- Oculta mágoa vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
– Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

O que é certo é que a pálida Senhora,
a transcendente Dama de Brabante,
tem um filho horroroso...
e de quem cora o pai, no escuro, passeando errante.

É um filho horroroso e jamais visto!
- Raquítico, enfezado, excepcional,
todo disforme, excêntrico, malquisto,
– pêlos de fera, e uivos de animal!

Parece irmão dos cerdos ou dos ursos,
aborto e horror da brava Natureza...
– Em vão tentam barões, com mil discursos,
desenrugar a fronte da Duquesa.

Sempre a Duquesa é triste.
- Oculta mágoa vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
– Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

Ora o monstro morreu.
- Pelas arcadas do palácio retinem festas, hinos.
Riem nobres, vilões, pelas estradas.
O próprio pai se ri, ouvindo os sinos...

Riem-se os monges pelo claustro antigo.
Riem vilões, trigueiros das charruas.
Riem-se os padres, junto ao seu jazigo.
Riem-se nobres e peões nas ruas.

Riem aias, barões, erguendo os braços.
Riem, nos pátios, os truões também.
Passeia o duque, rindo, nos terraços.
- Só chora o monstro, em alto choro, a mãe!..

Só, sobre o esquife do disforme morto,
chora, sem trégua, a mísera mulher.
Chama os nomes mais ternos ao aborto...
– Mesmo assim feio, a triste mãe o quer!

Só ela chora pelo morto!..
A mágoa lhe arranca gritos que a ninguém mais deu!
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
– Cantando, os rouxinóis lembram o céu...

Gomes Leal

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

o "Ar" com que se fala

O "ar com que se fala" é tão importante como o que se diz!

Disseram-me um dia perante a minha incapacidade de disfarçar a insegurança.

Achei estranho, querem lá ver que o que importa é "o ar"? granda merda, como é que vou arranjar um "ar"? Lá estudar...eu ainda sei como é que se faz, agora arranjar um "ar"...
Os anos passaram, lá fui disfarçando a insegurança como pude, e não voltei a pensar neste assunto.

Alguns anos depois voltei a ser novamente confrontada com essa coisa do "ar".
Estando a "não ouvir" um colega falar sobre um assunto (os conhecimentos do orador na matéria em questão eram óbviamente parcos) , segredam-me ao ouvido "Sabes que este gajo é que vai fazer os acordos com as empresas que fornecem isto, a nível nacional?" " Porra mas o gajo não percebe nada disto!" respondo eu com o meu "ar" indignado.
Ao que o interlocutor, mais atento e experiente me responde: "Eh pá parece que és parva, claro que o tipo está bem relacionado mas já reparaste bem no ar com que fala?"

Comecei a olhar mais atentamente a criatura, era verdade, disparava frases sem interesse com um discurso de tipo doutoral, de cátedra.
Sem vergonha, sem pudor, sem ciência, apenas com um fantástico e inimitável "ar".

Agora, mais atenta que tenho andado a este fenómeno, posso afiançar, é mesmo verdade!
O que importa, na maioria das vezes, é o que parece.
Ninguém se pode dar ao luxo de simplesmente...ser.

Claro que os "bons relacionamentos" têm também um papel muito importante!
Penso que merecem mesmo um post dedicado especificamente a essa instituição nacional que é a "cunha".
Fica para a próxima.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Sair da clandestinidade

Pois bem, esta coisa de construir um blogue e depois não o dar a conhecer a ninguém é um nadinha disparatado, por isso, hoje resolvi deixar de ser "anónimo" no meu blogue favorito e assumir o estatuto de "aspirante a blogueira"!

Como é bom de ver este tem sido um blogue verdadeiramente autista, mas o tempo é pouco...
Bom, o que interessa é que saí da clandestinidade, agora quem quiser pode vir aqui de vez em quando ler os disparates que vou escrevendo...se não tiver mesmo nada melhor para fazer.

Mas hoje só vim aqui para fazer "propaganda" a um espaço que abriu na antiga fábrica de Braço de Prata e que se chama "Ler devagar", é uma continuação da livraria com o mesmo nome que havia no Bairro Alto.
Agora é um espaço grande, com muitos livros, salas com exposições, concertos, uma loja do "Comércio Justo" e muito mais. Ainda só conheço de forma virtual, mas já agendei a visita para o fim de semana.

Voltarei em breve, estejam atentos :)